Não tem sinal de celular. Muito menos wifi. Não tem TV no quarto, nem telefone.

Mas, ao abrir a janela, você ouve o canto de pássaros – tantos, que você mal sabe para que lado olhar. Você enche os pulmões com ar puro, e os olhos com a paisagem. Você lava a alma na água gelada do rio e da cachoeira, esvazia a cabeça de preocupações, enche o coração de paz e a barriga de comida caseira.

Santuário do Caraça
Eis o seu despertador natural no Santuário do Caraça! Crédito da Foto: Simone Costa

Você joga conversa fora, vê o tempo passar, contempla as flores e pode até rezar. Se tiver sorte, você pode ver de perto, bem de pertinho, um lobo-guará. Mas, se não conseguir, não tem problema. Todo o resto vale a pena, e você volta pra casa tentando lembrar por que é mesmo que a gente vive correndo, tão estressado que esquece de contemplar e agradecer a vida.

Este lugar mágico e ao mesmo tempo tão simples é o Santuário do Caraça – uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) que fica nos municípios de Catas Altas e Santa Bárbara, em Minas Gerais, a cerca de duas horas de carro de Belo Horizonte.

O parque está em uma área de transição da mata atlântica para o cerrado – o que dá uma bela e interessante mistura de vegetação. A fauna local é igualmente rica: são mais de 200 espécies de aves, segundo a Wikipedia, e 65 espécies de mamíferos, entre elas saguis, quatis, suçuaranas, antas, pacas, tamanduá-mirim e o famoso lobo-guará, “mascote” da reserva, espécie típica do cerrado e ameaçada de extinção.

Os 11.233 hectares ficam sob a proteção dos padres lazaristas da Congregação da Missão, que também cuidam da igreja Nossa Senhora Mãe dos Homens (do século XVIII, localizada na parte mais alta da reserva) e administram o museu e a pousada, instalada no prédio do antigo seminário. Como convém a um local religioso, o ambiente não tem luxos. Mas, em um lugar onde o mais legal é ficar fora do quarto, isso não é nenhum problema.

Santuário do Caraça 1
Igreja Nossa Senhora dos Homens. Crédito da Foto: Simone Costa

Há cerca de trinta anos, o parque cultiva uma curiosa tradição: todas as noites, ao término da missa, um dos padres deixa uma bandeja de carne no pátio da igreja. Enquanto comem pipoca e tomam chá, os hóspedes da pousada escutam histórias sobre o lobo-guará e explicações a respeito dos hábitos do animal. E, dali a algum tempo (que pode chegar a horas), o lobo vem comer. Papai e mamãe lobo costumam se revezar e levar comida para os filhotes, escondidos na mata. A confiança é tanta que, enquanto come, o lobo chega a dar as costas para a platéia extasiada que lota o pátio.

Lobo_Guará_no_Santuário_do_Caraça
Foto do Lobo Guará comendo na bandeja colocada no pátio da Igreja. Foto de autoria de Samuel de Oliveira Fortunato e disponível no Wikimedia Commons

Infelizmente, quando estivemos lá, não conseguimos testemunhar este momento – e por isso a foto retirada do Wikimedia. Na primeira noite, chegamos ao pátio por volta das 19h e esperamos até umas 22h – mas ele só veio pra lá de meia-noite. Na segunda, resolvemos ir mais tarde, por volta de 22h40 – e o lobo tinha acabado de sair! Só nos restou ouvir, frustrados, os uivos ecoando pela floresta. Mas os amigos que estavam conosco (visitando o Caraça pela terceira vez) garantiram: a experiência é inesquecível! 🙂

Santuário do Caraça VI
Frente do pátio da Igreja, e onde por onde o lobo vem. Crédito da Foto: Simone Costa

Bom, mesmo sem conseguir um tête-à-tête com o lobo, há muito o que se aproveitar. Durante o dia, são diversas trilhas para serem exploradas e várias delas podem ser percorridas sem necessidade de guia (é recomendado ir em grupo, no entanto). As mais visitadas são as da Cascatinha (cerca de 20 minutos de caminhada) , da prainha fluvial (15 minutos) e o banho do Belchior (40 minutos).

Santuário do Caraça VII
Trilha para a Cascatinha. Crédito da Foto: Simone Costa
Santuário do Caraça X
Foto da Cascatinha. Crédito da Foto: Simone Costa

 

Santuário do Caraça XI
Prainha Fluvial. Crédito da Foto: Simone Costa

Em um dos acessos aos jardins da igreja, uma inscrição no chão marca a pedra onde D. Pedro II teria escorregado e levado um tombo. Aliás, o imperador brasileiro foi um visitante reincidente do Caraça – no pequeno museu, podem ser vistos objetos e móveis que pertenceram a ele, como a cama imperial e um diário.

Santuário do Caraça IX
O selo real marca a pedra onde D. Pedro II escorregou. Crédito da Foto: Simone Costa

Instalado onde funcionava uma escola para meninos (desativada após o incêndio ocorrido na década de 60), o museu tem uma coleção de peças de época e divide o espaço com mostras fotográficas e a biblioteca do Caraça, que possui em seu acervo obras dos séculos XVI a XIX.

Santuário do Caraça IV
Da esquerda pra direita: Igreja, museu (o prédio chamuscado, que era escola e sofreu o incêndio de que falei no texto) e pousada (de paredes brancas, onde era o antigo seminário). Crédito da Foto: Simone Costa

Importante dizer que o parque está aberto diariamente de 8h às 17h para visitantes externos, portanto antes e após esse horário só os hóspedes da Pousada do Caraça podem desfrutar da reserva – assim como da possibilidade de ver o lobo.

Onde se hospedar:

Ficamos na Pousada do Caraça.

O esquema para quem fica na pousada é pensão completa. Fora das refeições principais, as opções são a lanchonete próxima ao centro dos visitantes e uma vendinha no setor do claustro. Embora não tenham TV nem telefone, os quartos têm frigobar disponível para os hóspedes levarem seus belisquetes (queijos e vinhos são uma boa ideia para curtir as noites – sempre frias – do Caraça). E não se paga pela água de beber, disponível em garrafas repostas nos quartos e em bebedouros espalhados pela pousada. No entanto, uma coisa que chama a atenção é a coloração da água, em um tom ferruginoso – não só nos filtros e bebedouros, mas também no rio, nas cachoeiras e em todas as torneiras da região. Embora a administração da pousada informe que ela é potável, eu não consegui me conciliar com a ideia de beber água alaranjada, então comprava água mineral na lanchonete da pousada.

Como opção de hospedagem, há uma série de pousadas fora do parque, a maioria delas situadas ao longo da estrada de acesso.

Para saber mais informações sobre como fazer a reserva na Pousada do Caraça, clique aqui. Outra opção é a Pousada Fazenda do Engenho (clique no nome para saber mais).

[box type=”info”] O Santuário do Caraça é uma Unidade de Conservação, ou seja, uma reserva ecológica habitada por diversas espécies animais. Para sua segurança e para a conservação desta área protegida, siga as normas de visitação da administração do parque: utilize sapatos fechados e ande sempre pelas trilhas; não vá caminhar sozinho e nem permita que crianças andem desgarradas do grupo. É proibido acampar, caçar, pescar e coletar, assim como trazer para a reserva qualquer espécie animal ou vegetal. Observe o horário de visitação e a relação de trilhas que necessitam de guias. E é sempre bom lembrar: nada de jogar lixo no chão ou fazer fogueiras.

Para mais informações sobre o parque, como taxas de visitação e reservas, clique aqui.

Cuidados tomados, aproveite a natureza e bom passeio! 🙂 [/box]

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Catarina Donda
Profissional de comunicação, esposa e mãe multitarefa. Para não negar o sobrenome, também sou adepta do "dondear" por aí. Adoro música, livros, viagens, História. Se puder viver tudo isso em família, então, melhor ainda! Uma amiga certa vez me disse: "Desta vida, só se leva o que a gente viaja e o que a gente come". Nunca mais esqueci. Além da interpretação literal da frase (que não inclui se empanturrar, mas sim apreciar uma boa mesa com moderação rs), a declaração resume, para mim, o investimento em momentos inesquecíveis ao lado das pessoas que amamos, experiências cujas lembranças se tornam o nosso maior patrimônio.

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