Nas minhas últimas férias, quando eu dizia que iria visitar cânions no Rio Grande do Sul, quase todos reagiam com a mesma surpresa: “Cânions? No Brasil? Nunca ouvi falar…”
Pois eles existem, sim, e são absolutamente deslumbrantes. Daquelas paisagens que você guarda pra sempre na memória e no coração. E nada como descobrí-los em família!
O destino é Cambará do Sul, na região de Campos de Cima da Serra, a cerca de duas horas e meia de Porto Alegre, quase na divisa com Santa Catarina. O pequeno município de aproximadamente 6 mil habitantes possui dois parques nacionais: o Aparados da Serra, a 18 km do centro da cidade, onde fica o cânion do Itaimbezinho; e o da Serra Geral, a 23 km do centro, onde fica o cânion Fortaleza. Ambos são acessíveis por estrada de terra, que dá para encarar até com carro de passeio se não tiver chovido muito.
O Parque Nacional Aparados da Serra é o mais estruturado dos dois: tem centro de visitantes com maquete e fotos da área, locais para piquenique e guarda-corpo nos mirantes. Seu principal cânion, o Itaimbezinho, é o mais famoso da região. O nome, que em tupi guarani significa “pedra cortada”, é uma boa metáfora para os paredões de 5,8 km de extensão e 720 metros de profundidade.
Na parte superior do cânion, existem duas trilhas: a do Vértice (1,4 km de extensão) e a do Cotovelo (total de 6 km, ida e volta). Ambas são fáceis e podem ser percorridas com ou sem guia (e também de bicicleta, no caso da trilha do Cotovelo). Para quem vai sem crianças, na parte baixa do Itaimbezinho fica a trilha do Rio do Boi (acessível por Praia Grande/SC), que acompanha o rio pelo interior do cânion e só pode ser feita com a contratação de um guia. São 8,3 km de percurso, com nível alto de dificuldade e paradas para banho.
Já o Parque Nacional da Serra Geral não tem nenhuma infraestrutura, porém é onde fica o Cânion Fortaleza, considerado o mais belo da região. O nome Fortaleza se deve aos seus imponentes paredões, que se assemelham a muralhas. Com 7,5 km de extensão, 2.000 m de largura e uma altitude de 1.240 m, é um cânion majestoso.
A principal trilha do parque, a do Mirante da Fortaleza, tem um total de 3,5 km e conta com quatro pontos de observação. Exceto por alguns trechos um pouco íngremes, é um percurso fácil.
Outra trilha bastante visitada, com cerca de 2,7 km de extensão, é a da Cachoeira do Tigre Preto e da Pedra do Segredo (uma rocha de 5m de altura e 30 toneladas, equilibrada enigmaticamente sobre uma pequenina base). A trilha tem dificuldade média, por causa de trechos íngremes e da travessia de um riacho, mas a caminhada é recompensada pela vista da quase totalidade do cânion Fortaleza.
E para os experientes e sem crianças, a trilha dos cânions Churriado e Malacara é a mais longa, com percurso total de 24 km (ida e volta) e cerca de 7h de duração.
Para quem vai em família, o ideal é dividir a visita em pelo menos dois dias, que é para aproveitar com calma a parte que dá para fazer com crianças de cada parque e combiná-los com outros passeios na região. Foi o que fizemos, e detalho abaixo nosso roteiro:
Dia 1 – Cânion Itaimbezinho e Trilha das Bromélias
Saímos logo cedo rumo ao Parque Nacional Aparados da Serra. O tempo estava fechado, mas como era o único dia que tínhamos para visitar esse parque, arriscamos mesmo assim.
Começamos pela trilha do Cotovelo, que inicia em uma ponte sobre o arroio Preá e segue por uma estrada larga e cercada de mata nativa.
Ao nosso redor, incontáveis araucárias, e de vez em quando uma gralha azul – o pássaro adora comer pinhão, e como tem o costume de enterrar alguns para comer mais tarde (e acaba esquecendo onde deixou), é o principal responsável pelo plantio da árvore.
Ao fim da caminhada, que é super agradável, chegamos à borda do Itaimbezinho. Embora a neblina estivesse cobrindo praticamente tudo, de vez em quando as nuvens se abriam, podíamos vislumbrar um pouco do paredão de rocha e ter uma idéia da beleza que isso tudo deve ter em tempo bom!!!
Seguimos dali para a trilha do Vértice, que é parcialmente pavimentada. Como o tempo começou a melhorar, conseguimos ver as cascatas da Andorinha (cerca de 300m altura), Véu da Noiva (500m) e parte do cânion do Itaimbezinho, além de uma araucária de mais de 150 anos. Lindas paisagens!
Uma curiosidade da região é a presença do líquen rosa (também conhecido como líquen vermelho), uma espécie que, supostamente, é indicadora da boa qualidade atmosférica e só ocorre em locais onde o ar é puro. Pelo mesmo motivo, a “barba-de-pau” que cresce nas árvores e eu conhecia como marrom, lá tem um tom verde-água.
Mesmo com a pouca visibilidade na borda do cânion, o saldo do passeio foi pra lá de positivo!
No fim da tarde, fizemos a Trilha das Bromélias, que parte do Cambará Eco Hotel, onde estávamos hospedados. É uma trilha de cerca de 1,5 km por dentro da mata de araucárias, terminando em uma colina com vista para toda a cidade.
Nosso guia foi o sr. José Antônio, um dos donos do hotel. Ao longo do trajeto, ele nos contou sobre a história de Cambará e do Rio Grande do Sul, sobre as araucárias, o ecossistema da região e a importância da conservação da natureza. Uma verdadeira aula, que me pareceu preparada especialmente para as crianças, de forma didática e envolvente. O ponto alto do passeio foi o plantio do pinhão, de que toda a família participou. Adoramos! De volta ao hotel, a esposa do sr. José Antônio cozinhou para nós alguns dos pinhões colhidos na mata. Estavam deliciosos!
Dia 2 – Cânion Fortaleza e Sítio Querência Macanuda
O dia amanheceu prometendo, com céu limpo, e não nos decepcionou. Partimos cedo para o parque da Serra Geral e logo que chegamos, fomos presenteados com um encontro com um graxainho (cachorro do mato típico da região), que tomava sol tranquilamente na área do estacionamento.
Fomos direto para a trilha do Mirante da Fortaleza. Em poucos minutos de caminhada, já chegamos ao primeiro ponto de observação: deslumbramento total! O cânion se estendia diante de nossos olhos e a visibilidade era perfeita, tanto do desfiladeiro abaixo quanto dos paredões adiante, que adquiriam um tom de azul conforme se confundiam com o horizonte.
Era só o começo. Continuamos a caminhada, desta vez por um trecho mais íngreme, e do lado oposto ao do primeiro mirante, pudemos visualizar até o litoral gaúcho e catarinense!
Na terceira parada, em um ponto ainda mais alto, vimos todo o caminho que tínhamos percorrido até então, além de imensas áreas planas sobre os paredões rochosos e mais detalhes da fenda do cânion, como uma cachoeira que se dissipa no ar e que não era visível do primeiro ponto.
E enfim chegamos ao topo, a mais de 1.200m de altitude, com paisagens deslumbrantes até onde a vista alcançava!!! O cenário era um pouco de tudo o que foi visto até então, e ainda mais, em um ângulo de 360 graus. As fotos aqui tentam ilustrar um pouco disso tudo, mas não chegam perto da beleza e da grandiosidade arrebatadoras do lugar.
É tudo tão bonito, que a gente não conseguiu sentir medo da altura ou do fato de não haver nenhuma cerca de proteção. É claro que tivemos todo o cuidado, especialmente com o filhote, segurando a mão dele ao longo de todo o trajeto e mantendo distância segura das bordas.
Mas medo foi algo que sequer nos passou pela cabeça. Diante de tanta imponência da natureza, você não sente medo, se sente perto de Deus.
O único incômodo foi o vento, que é super forte lá no alto. Indispensável o uso de gorro ou capuz que tape as orelhas, para não correr o risco de ficar com dor de ouvido, especialmente no inverno.
Não fizemos as outras trilhas, pois havia chovido muito nos dias anteriores. Mas não precisa nem dizer que adoramos o Parque da Serra Geral!
À tarde, fizemos uma visita ao sítio Querência Macanuda, vizinho ao nosso hotel. O casal Vico e Cláudia (ele carioca, ela gaúcha) teve a coragem de fazer o que muitos sonham, mas não ousam: largar a vida louca da cidade grande para recomeçar, com qualidade de vida, no interior. Em seu sítio, eles plantam amoras, framboesas, mirtilos e outras delícias em sistema orgânico, e produzem as geléias mais saborosas que já provamos (daquelas pedaçudas e doces na medida certa).
Batemos um papo com os donos, degustamos geleias, apreciamos a paisagem bucólica (com ovelhinhas e tudo) e saímos de lá com um pequeno carregamento de gostosuras.
E falando em gostosuras, outra compra certa é o mel. Não sabíamos, mas Cambará do Sul é conhecida como Capital do Mel e referência no produto – um resultado da combinação do clima com a pureza das águas da região, segundo nos explicaram. O fato é que o mel é delicioso, e vale muito a pena levar pra casa. Compramos um pote no próprio hotel. Para os que quiserem conhecer mais sobre a produção de mel na cidade, existe um roteiro turístico também neste site aqui.
E não, isto não é um post patrocinado. Provei, gostei e estou dividindo com os leitores. O que é bom a gente tem de prestigiar.
Tanto a Trilha das Bromélias quanto o sítio Querência Macanuda fazem parte do projeto turístico Quintais de Cambará do Sul, criado por ocasião da Copa do Mundo para combinar roteiros culturais e gastronômicos às visitas aos cânions, proporcionando ao turista uma vivência das tradições e da cultura gaúcha. Além dos passeios que fizemos, há também visitas a artesãos e fazendas, cavalgadas e apresentações regionais, entre outras atrações. Este vídeo ilustra um pouco dos roteiros.
Bons motivos para estender a visita ou retornar a Cambará!
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Dá para fazer o passeio com crianças pequenas e pessoas idosas?
Embora o percurso que fizemos no Parque Aparados da Serra (trilhas do Vértice e do Cotovelo) não tenha dificuldades para crianças e idosos, as menores e os mais sedentários podem se cansar com a caminhada de 6 km da trilha do Cotovelo. Já no Parque da Serra Geral, a trilha do Mirante da Fortaleza tem dificuldade média por causa de alguns trechos íngremes, mas dá para fazer com crianças maiores – idosos, porém, só os mais atléticos. Para ambos os parques, acredito que a idade ideal seja a partir dos sete anos. Não dá para levar carrinho de bebê e carregar uma criança pequena pode ser perigoso se tiver chovido e, no caso da Serra Geral, por causa das muitas pedras do trajeto. [/box]
[tabs slidertype=”top tabs”] [tabcontainer] [tabtext]Quando ir[/tabtext] [tabtext]Onde ficar[/tabtext] [tabtext]Onde comer:[/tabtext] [tabtext]Como chegar[/tabtext] [/tabcontainer] [tabcontent] [tab]Segundo o pessoal da região, tivemos azar de pegar neblina e chuva no mês de junho. Embora o clima por lá seja instável, é no inverno que a visibilidade dos cânions é melhor e o período mais favorável do dia é a manhã. De qualquer forma, vale a pena retornar no verão, para aproveitar cachoeiras e fazer trilhas que passam por rios. O Parque da Serra Geral está aberto diariamente e o Parque Aparados da Serra, de terça a domingo. Ambos funcionam de 8h às 17h. A entrada no Serra Geral é gratuita; já no Aparados da Serra, o ingresso custa R$ 6,50 e o estacionamento, R$ 5,00. Menores de 12 anos e maiores de 60 não pagam.[/tab] [tab]Nós fechamos uma parceria do blog com o Cambará Eco Hotel, com uma tarifa especial. Gostamos bastante. O hotel fica no início da estrada para os cânions e a uns cinco minutos do centro de Cambará do Sul. É eco-friendly, tem quartos confortáveis, funcionários atenciosos, uma vista linda para o lago ao lado e um café-da-manhã delicioso, feito com produtos da região.
Outras opções de hospedagem em Cambará: Vila Ecológica, o Recanto das Gralhas, o Cabanas Brisa dos Caniôns, e o Parador Casa da Montanha. Você também poe pesquisar mais hotéis aqui.[/tab] [tab]Gostamos da experiência de almoçar no restaurante Galpão Costaneira, em Cambará, que serve comida campeira. O restaurante tem estilo rústico, é decorado com elementos típicos da cultura gaúcha e funciona em esquema de buffet. Pode-se acrescentar ao buffet uma generosa porção de churrasco, lingüiça e queijo serrano servidos na chapa. Meu pequeno aventureiro, após caminhar mais de 7km, bateu dois pratões![/tab] [tab]A partir de Porto Alegre, são três opções: via Gramado e Canela (seguindo em direção a São Francisco de Paula e de lá para Cambará do Sul); pela RS 020, passando por Cachoeirinha, Gravataí, Taquara e São Francisco de Paula; e pela BR 290 e RS 486 (Rota do Sol).[/tab] [/tabcontent] [/tabs]
Esta colaboradora do blog viajou ao Parque Nacional de Aparados da Serra por conta própria, mas somente a hospedagem foi feita em parceria com o Hotel Cambará Eco Hotel. Todas as opiniões, porém, são genuínas e refletem as impressões da autora.
Muito Obrigado pelas ótimas informações. Ajudaram muito no planejamento da viagem.
olá, gostaria de saber o local que fez as cavalgadas